Estudo exclusivo da CNI mostra que gastos com profissionais de proteção de dados consumiriam todo o faturamento anual das micros brasileiras
A nomeação dos diretores da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) abre espaço à discussão sobre os melhores caminhos a serem adotados para preservar a privacidade dos cidadãos e, ao mesmo tempo, garantir segurança jurídica para os negócios das empresas que coletam e tratam dados, principalmente as micro e pequenas, na implementação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A Confederação Nacional da Indústria (CNI) defende a criação de regras mais simples para as micro e pequenas empresas como principal prioridade da recém-criada ANPD. Este vai ser o ponto central do painel sobre o tema a ser realizado no Encontro Nacional da Indústria (Enai) na quarta-feira (18), às 16h.
O tratamento diferenciado para as micro e pequenas empresas está previsto na Constituição e na LGPD e é uma realidade em mercados mais avançados nessa área, como a Europa. As empresas com menos de 250 empregados do países-membros do Mercado Comum Europeu não precisam manter registro das operações de tratamento de dados pessoais que realizam a menos que o processamento de informações seja a atividade regular da empresa, com real potencial de dano ao consumidor. Elas também são eximidas de nomear um profissional específico para lidar com o tratamento dos dados.
Esses são dois pontos que a CNI defende. Na avaliação da entidade, a obrigatoriedade de manter registro das operações de tratamento de dados e a nomeação de um encarregado, uma espécie de ouvidor da LGPD, são incompatíveis com a realidade das empresas de menor porte. De acordo com estimativas divulgadas pela mídia recentemente, o salário de um encarregado gira em torno de R$ 20 mil e o custo total incluindo encargos trabalhistas, supera os R$ 360 mil por ano, valor equivalente ao teto de faturamento anual de uma microempresa no Brasil.
Se levarmos em consideração o número de colaboradores como critério de classificação do porte das empresas, mais de 85% das empresas industriais são micro. Sem o tratamento diferenciado, elas terão de canalizar recursos fundamentais para a própria subsistência para uma adequação, na avaliação da CNI, desnecessária à LGPD. Na indústria, de acordo com a última edição da RAIS há quase 476,2 mil empresas industriais no Brasil, pouco mais de 5 mil possuem mais de 250 empregados. Por outro lado, 405,8 mil têm menos de 20 empregados.
Mesmo com o tratamento diferenciado defendido pela CNI, as micro e pequenas empresas continuam sujeitas integralmente à LGPD. A medida apenas simplificará algumas exigências, como a necessidade de registrar todas as operações de tratamento e dará mais prazo para o cumprimento de outras obrigações, como o tempo que as empresas têm para fornecer relatórios para os usuários sobre o tratamento dos dados.
“A atuação da ANPD vai ser fundamental para termos uma aplicação da lei que harmonize os interesses nacionais, o direito à privacidade do consumidor e para criar condições para o desenvolvimento de novos modelos de negócios que envolvam dados. A aprovação da LGPD representou um enorme avanço na relação do Brasil com mercados estratégicos. É importante termos uma implementação adequada, aproveitando a curva de aprendizagem de outros países”, Fabiano Barreto, especialista em política e indústria da CNI, responsável por conduzir o painel sobre a LGPD no ENAI.
De acordo com o artigo 55 da LGPD, compete à ANPD “editar normas, orientações e procedimentos simplificados e diferenciados, inclusive quanto aos prazos, para que microempresas e empresas de pequeno porte, bem como iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo que se autodeclarem startups ou empresas de inovação, possam adequar-se a esta Lei”.
Fonte: Revista Exame por Bússola